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segunda-feira, 26 de junho de 2017

Audiência Pública debate violações dos Direitos Humanos no Oeste da Bahia

AAudiência Pública leva parlamentar da Bahia a debater tema dos atingidos

Atividade realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa da Bahia é provocada por MAB, após ação violenta de empresa na região
Centenas de pessoas estiveram presentes na quinta-feira, 13 de outubro, no município de Jaborandi, no oeste da Bahia, em Audiência Pública de denúncia das violações de direitos na região em decorrência de ameaças de implantação de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) em suas águas.
Região de Cerrado, o Oeste é uma das mais ricas no estado em abundância de água, tendo sido citada por estudo como localidade com aproveitamento hídrico para a implementação de mais de 100 PCHs. Assim, a região e sua população sofrem com as ameaças de implantação de PCHs há pelo menos 20 anos.
Atualmente, são cerca de trinta processo de licenciamento ambiental em andamento em todo o Oeste, e desde o ano 2012 os conflitos têm se acirrado. São frequentes os relatos de violações de direitos humanos nas comunidades atingidas por estas PCHs, com ameaças e violência psicológica, falta de informações, uso desnecessário da força policial, chegando até mesmo à invasão de território por parte das empresas. Essa realidade de violações não difere de outras regiões do país onde são feitos empreendimentos dessa natureza, conforme atestou relatório da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, CDDPH/Governo Federal, em 2010.
A atividade foi realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Bahia, provocada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). “Nós precisamos dar visibilidade para o que acontece aqui na região, que acaba ficando em um isolamento. Com a audiência, pudemos trazer a público as violações sofridas por essas famílias e denunciar que mesmo antes de construídas, as barragens já provocam um grande passivo”, declara Temóteo Gomes, coordenação nacional do MAB.
O deputado Marcelino Galo, presidente da Comissão, afirma que esse é um importante momento, já que é a primeira vez que a Comissão se desloca para tratar do tema dos atingidos. “Temos que nos armar, do ponto de vista de organização e informação, para não permitir que intervenções como as grandes usinas ou pequenas hidrelétricas continuem causando tantos impactos para uma parte da população em detrimento de outra”, afirma o deputado. Ele reforça que a água não deve ser usada como mercadoria, gerando o lucro para uma minoria e causando problemas à grande maioria da população, de trabalhadores rurais e camponeses.
Estiveram presentes na Audiência Pública representantes do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos-Inema, Secretaria de Segurança Pública, Comando da Polícia Militar, Secretaria de Infraestrutura Hídrica e Saneamento, Frente Ambientalista da Assembleia da Bahia, além de atingidos e atingidas da região. A Audiência consagrou uma Carta Aberta à População Baiana, escrita pelo MAB, onde estão apontados do 16 direitos humanos sistematicamente violados em situação de barragens no Brasil e a realidade que vive o Oeste da Bahia.
Os órgãos presentes se comprometeram em dar encaminhamento às demandas apontadas no documento. São elas: Esclarecimento/Posicionamento sobre as violações ocorridas no Oeste Baiano; Informações do Estado sobre licenças/outorgas, estudos sobre empreendimentos de energia na Região Oeste; Encaminhamentos da Assembleia Legislativa do Estado quanto à instituição da Política Estadual de Direitos dos Atingidos por Barragens/Grandes empreendimentos; criação de uma Frente Parlamentar em Defesa dos Atingidos por Barragens na Assembleia Legislativa do estado da Bahia na perspectiva de construir a Política Estadual de Direitos dos Atingidos por Barragens/Grandes empreendimentos.
O Deputado Marcelino Galo reforça que irá garantir que chegue ao conhecimento do Governador da Bahia um Relatório detalhado da Audiência. O parlamentar afirma que a também levará a conhecimento da Secretaria de Direitos Humanos e Justiça da Bahia para que sejam criadas formas de fazer o acompanhamento dessas ações que impactam a vida dos trabalhadores. “É direito participar e discutir, e caso seja criado um impacto, o atingido deve ter a garantia da participação ampla. Não se pode fazer licenciamento ambiental sem ouvir a população envolvida e os órgãos de interesse, como o município, organizações, e as diversas instituições que compõe o Estado, é fundamental a participação ampla para discutir os caminhos”, critica Marcelino.
Na avaliação de Andreia Neiva, Coordenação Nacional do MAB, e também ameaçada por uma PCH na região, a atividade foi muito boa com grande participação popular e alcançou os objetivos propostos. “Os atingidos ficaram animados já que durante todo esse tempo de investida das empresas nunca tiveram uma oportunidade como essa em que pudessem expor diante do Estado o que vem acontecendo”, relata Andreia. Ela reforça que foi um momento de desabafo, mas também foi possível vislumbrar encaminhamentos concretos. “Os atingidos tem a consciência de que esse momento só foi possível devido à luta coletiva e organização no MAB”, comemora a militante.
Invasão e Violência, Caso-chave da Audiência
As comunidades dependentes dos rios Carinhanha, Itaguari, Corrente, Arrojado e Formoso vêem na implantação de PCHs o fim de seus costumes e meios de vida há muito anos. Ainda assim, um caso ocorrido há pouco mais de um ano surpreendeu aos atingidos da região por seu alto grau de violência e demonstração barata de poder.
A PCH do Arrodeador, proposta para o Rio Formoso, vem ameaçando moradores da região há pelo menos 10 anos, tendo a empresa usado de diversas tentativas diferentes de coerção. A militante Andreia conta que a Data Traffic cooptou um morador da região e comprou uma propriedade dentro da comunidade em segredo, enganando a população local.
No início de 2015, em determinada manhã, os moradores de comunidades próximas ao rio foram surpreendidos pela visita de oficial de justiça que trazia intimações de permissão de entrada em suas propriedades. No entanto, o que espantou a região não foram as intimações e sim quem acompanhava os oficias: a Polícia Militar, fortemente armada, e técnicos da empresa Data Traffic S.A., propositora da PCH do Arrodeador.
“Eles entregaram a intimação com a presença da Polícia, para coagir as famílias, eram muitos e estavam armados. Todos os intimados eram idosos, entre 50 e 70 anos, foram intimados até mesmo alguns que já tinham morrido. Além disso, já levaram os técnicos da empresa para entrarem de uma vez”, indigna-se Andreia.
Rapidamente os atingidos se organizaram e se juntaram aos intimados em quase 100 pessoas, que junto com o MAB negociaram para que a empresa não entrasse no local naquele momento. “Se eles entrassem forçado naquele dia teria acontecido uma tragédia, porque o povo estava muito nervoso”, explica a militante. No dia seguinte foi realizada uma reunião entre o MAB e a empresa, com a mediação do Prefeito de Coribe. 
Timoteo, militante do MAB e morador da região, explica que a entrada da empresa na área é fundamental para a realização dos estudos para a implantação da PCH, bem como para a realização da licença Ambiental. “Eles escolheram as áreas estratégicas para fazer a intimação, pois era o local onde queriam medir para fazer o canteiro de obras, onde seria toda a estrutura para iniciar o processo de licenciamento ambiental”, conta. Durante os 13 dias seguintes à “visita” da oficial de justiça, militantes do MAB acamparam na entrada da comunidade Laranjinha, para a proteção dos moradores e da região.
A partir daí, foi feita a contestação do processo junto à promotoria e a juíza revogou a sua decisão anterior. “Foi uma conquista muito grande, temos esse momento importante, mas a luta já vem sendo travada há muito tempo. A luta que temos feito é em defesa do Cerrado, que é a “mãe das águas” mas é também onde está o agronegócio no nordeste, grandes fazendas de soja, milho, café”, afirma Temóteo.
Após a realização da Audiência Pública, os atingidos seguem sua lita diária em defesa do território, das águas e terras. “foi mais uma etapa do processo de luta, agora é continuar a articulação junto aos órgãos competentes e seguir com a mobilização e  organização junto ao povo”, planeja Andreia.  

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