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quinta-feira, 29 de junho de 2017

Território de Identidade do Baixo Sul da Bahia


UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA
CENTRO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO   DO CAMPO - PPGEDUCAMPO
 






DOSSIÊ
O POVO EM LUTA NO BAIXO SUL DA BAHIA: CONFLITOS E RESISTÊNCIAS NA COSTA DO DENDÊ











Valença – BA
Junho de 2017








Aline de Oliveira Andrade
Taata Sobode (Jefferson Duarte Brandão)

Marineide dos Santos Ramos Silva



DOSSIÊ
O POVO EM LUTA NO BAIXO SUL DA BAHIA: CONFLITOS E RESISTÊNCIAS NA COSTA DO DENDÊ



Trabalho construído a partir do componente: Educação e Movimentos Sociais, ministrado pela professora Dr. Nalva Araújo no Mestrado Profissional em Educação do Campo – PPGEducampo/UFRB.








            Valença – BA
Junho de 2017  











   Sumário



Introdução .......................................................................................................... 05

1-  Tecendo fios e lutas: greve operária em Valença – BA .......................................... 08
1.1– Imagens e Fotografias ..........................................................................  09

2-      Em meio às águas de Cairú ecoa o grito dos quilombolas de Batateiras ............11

2.1 - Violação do território pesqueiro e quilombola de Batateiras ............................ 11
          2.2 - Atuação da DPU garante a quilombolas direito de não ter área                          invadida na BA............................................................................................................................   13

2.3 - Imagens e Fotografias ......................................................................................  14


3- Taperoá: quilombolas e pescadores em defesa do território de graciosa ....... 16
     3.1- Conflitos no território pesqueiro e quilombola de Graciosa .................. 17
            3.2 – Imagens e Fotografias .......................................................................... 23

4- A luta continua: considerações finais ............................................................... 24

5- Referenciais Bibliográficos ................................................................................ 25






Introdução

O Território de Identidade do Baixo Sul Baiano é composto pelos municípios de Aratuípe, Cairu, Camamu, Gandu, Ibirapitanga, Igrapiúna, Ituberá, Jaguaripe, Nilo Peçanha, Piraí do Norte, Presidente Tancredo Neves, Taperoá, Teolândia, Valença e Wenceslau Guimarães formam o território de identidade Baixo Sul, abrangendo uma área de 7.168,10Km2.
O Plano Desenvolvimento Territorial Sustentável apresentado pelo Conselho Gestor Territorial apresenta que “historicamente, a região do Baixo Sul caracterizou-se como uma área pioneira no processo de ocupação do Brasil, iniciado no século XVI. Através desses cinco séculos, a região passou por mudanças nas suas dimensões econômica, social, cultural e ambiental, exemplo da dinâmica e vitalidade extraordinária dos trópicos – das permanentes formações e transformações no tempo.
 Os primeiros 50 anos de colonização correspondem ao início da transformação da mata em áreas agriculturáveis nas ilhas de Cairu, e nos principais pontos de penetração continental, ciclo que foi interrompido na parte continental pela resistência dos índios Aimorés.  Neste momento aumentaram as pressões sobre as áreas naturais das próprias ilhas, visto que a região já na época foi considerada como estratégica para o fornecimento de farinha de mandioca para Salvador e Recôncavo. 
O Baixo Sul, contudo, caracterizou-se como uma área pioneira no processo de ocupação da região, pois as principais vias de penetração para o interior tiveram como ponto de origem os municípios de Cairu e Valença. Após as atividades de extrativismo do pau-brasil e exploração da cana-de-açúcar, Valença se constituiu em um núcleo de desenvolvimento regional que viria a se fortalecer a partir da segunda metade do Século XIX.
No Século XVI, mais precisamente em 1534, os Tabuleiros Costeiros de Valença – compreendendo a Sub-região de Jaguaripe até Ilhéus, da qual faz parte o Baixo Sul, habitados então pelos índios tupiniquins – passam a pertencer à Capitania de São Jorge dos Ilhéus, em conjunto com o Vale do Jiquiriça. Expulsos pelos índios Aimorés de área próxima a Ilhéus, os donatários da Capitania estabeleceram-se no ano de 1533 no arquipélago da atual Cairu, mas somente três décadas houve a colonização do litoral entre Guaibim e a primeira cachoeira do Rio Una, articulando-se a região, pela primeira vez, com o Recôncavo e Salvador.
Apesar do expressivo número de organização na região, ainda é incipiente seu envolvimento nos destinos comunitários mais gerais. Muitos desses movimentos se restringem à defesa dos espaços e interesses locais, ao desenvolvimento de ações específicas e à implantação de serviços e infra-estrutura básica, a exemplo das Associações de Pequenos Agricultores e Colônias de Pescadores.”
No artigo sobre o Território do Baixo Sul , Anderson Gomes da Epifania, expõem que

Esta porção do território baiano tem aspectos geográficos favoráveis, como a diversificação das atividades econômicas, a exemplo da policultura, os diversos serviços, em especial o turismo, além dos inúmeros ambientes costeiros e as atividades agroindustriais, em especial ao cultivo e beneficiamento do dendê. No planejamento turístico, a região é conhecida como Costa do Dendê, o que não reflete as políticas territoriais, pois, esta atividade descarta o rico palmeiral se concentrando nas ilhas e poucas praias, utilizando apenas o óleo já beneficiado para o uso nas iguarias dos restaurantes. O dendê, assim como os coqueiros, o cacau e as baleias, apenas servem para ilustrar uma característica marcante na paisagem ou no imaginário, que não necessariamente são frutos de intervenções que favoreçam a população. (EPIFANIA, 2012, p. 4)

O Baixo Sul é conhecido a nível nacional pelos pontos turísticos que possui, suas praias são locais de encontro de diferentes turistas. Além do turismo, os fatos históricos das fundações das cidades que compõem esse território são de grande relevância para a história do país.
Mas devido ao potencial natural para o turismo, bem como, a diversidade e tamanho da mata atlântica esse território sofre um processo de degradação do meio ambiente: exploração para o turismo, incentivo da monocultura que varia conforme a cidade (banana, guaraná, cacau entre outro) e a presença de empresas que visam alimentar o capital acima das tradições, do meio ambiente e comunidades.
Exemplo que trata sobre é a tese de José Renato Sant’Anna Porto, intitulada: Poder e Território no Baixo Sul da Bahia: Os discursos e os arranjos políticos de desenvolvimento, bem como, o artigo: Território de Identidade Baixo Sul Baiano: Análise Socioeconômica e Perspectivas, já citado, de Anderson Gomes da Epifania. Esses trabalhos apresentam um pouco da estrutura findaria existente no Baixo Sul, bem como, órgãos e empreses que tem sede nos municípios, porém não colaboram para um desenvolvimento pautado no respeito com a natureza, com as tradições e saberes existentes nesse território[1].

Mapa do Território de Identidade do Baixo Sul Baiano.

            Fonte: Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia





       1 - Tecendo fios e lutas: greve operária em Valença - BA

Por volta de 1844 inicia-se a implantação da primeira Indústria de Tecido de Valença, sendo esta a primeira Hidráulica e de tecidos finos de algodão no Brasil, foi então neste ano que começou os trabalhos de construção da Fabrica de Tecidos Todos os Santos. Empreendimento industrial, que teve características especificas tais como: um empreendimento de grandes proporções, que mereceu destaque no cenário econômico da época. Era um empreendimento no meio do nada, uma mine cidade de cerca de 300 operários com mais de 50% de operários do sexo feminino, conforme relatos de D. Pedro no seu livro o Diário de D. Pedro II, ao Norte do Brasil 1859/1860).
Fonte: ArtigosWeb. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/industrializacao-em-valenca/59643/#ixzz4kqkq8lw5>. Acessado em 20 de jun. de 2017.

O professor Mário Ronaldo Rodrigues Vieira na elaboração da dissertação para o mestrado na Universidade do Estado da Bahia (Campus V) pesquisou a memória das mulheres operárias da Companhia Valença Industrial (CVI). Esse trabalho apresenta fatos históricos: o trabalho realizado pelas mulheres, a existência de conflitos e greve, bem como a organização dos sindicatos.

A vida das operárias da CVI é marcada pela presença no meio operário. A convivência diária com o sindicalismo, movimentos sociais, greves, reuniões, e debates sobre as perdas e ganhos, que a atividade laboral proporcionava, produziu elementos de uma realidade de injustiças que eram percebidas nas perdas e ganhos destas mulheres, e a importância do trabalho destas operárias para a fábrica. (VIEIRA, 2010, p. 84)

Pesquisando também sobre a CVI, a dissertação de Neli Ramos Paixão, intitulada: Ao soar do apito da fábrica: idas e vindas de operárias(os) têxteis em Valença – Bahia (1950 – 1980), aborda sobre um período histórico de luta e enfrentamento por direitos.
Por compreender a relevância dos trabalhos citados, deixamos aqui os dados para realização de busca dos mesmos na internet (estão disponíveis em formato PDF).

Autor: Mário Ronaldo Rodrigues Vieira
Título: Memória das mulheres operárias da Companhia Valença Industrial (CVI)
Instituição: Universidade do Estado da Bahia – Campus V.
Ano: 2010

Autor: Neli Ramos Paixão
Título: Ao soar do apito da fábrica: idas e vindas de operárias(os) têxteis em Valença – Bahia (1950 – 1980).
Instituição: Universidade Federal da Bahia
Ano: 2006



1.1– Memórias Fotográficas
A) Movimento de greve realizado em 2009, entrada da fábrica que da acesso aos caminhões - CVI.


Fonte: Blog do Pelegrine. Disponível em: < http://pelegrini.org/politica/558>. Acessado em 28 de jun. de 2017.









B) Foto da CVI, no alto a Igreja Nossa Senhora do Amparo.

Fonte: Disponível em: <https://www.bing.com/images/search?view=detailV2&ccid=bWnj7yyF&id=12C2966C05C8953A6563EEFFCE8C0734C32F6025&thid=OIP.bWnj7yyFdOUOEcixyVxEvgEsDH&q=cvi+valen%C3%A7a+bahia&simid=608002967917955126&selectedIndex=29&ajaxhist=0>. Acessado em 22 de jun. 2017

C) Entrada da CVI
Fonte: Disponível em: <https://www.google.com.br/search?q=cvi+valen%C3%A7a&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwiB-P3RpuPUAhWJipAKHV1CDQYQ_AUICigB&biw=1137&bih=548#imgrc=slwLrRwAzqhqWM:>. Acessado em 22 de jun. de 2017.








2- Em meio às águas de Cairú ecoa o grito dos quilombolas de Batateiras
        
  Cairú é um arquipélago que possui diversas ilhas povoadas, conhecidas pela exuberância de suas lindas paisagens e uma zona costeira de belas praias. Conforme o IBGE o município ultrapassa os 17 mil habtantes, grande parte do povo nativo sobrevive da pesca e da mariscagem,no entanto, desde o final da década dos anos 90 tem se notado uma grande concentração fundiária movida principalmente pela expansão do turismo comercial que se instala na região.


2.1 – Violação do território quilombola e pesqueiro de Batateiras

Fazendeiro e quilombolas entram em conflito por terras no Baixo Sul da BA – 25/06/2011 -  Do G1 BA, com informações da TV Bahia
Fundação Palmares reconhece a área como remanescente de quilombo. Fazendeiro diz que nunca existiu ninguém na comunidade.
A comunidade de Batateira, em Cairú, no baixo sul da Bahia, denuncia um fazendeiro da região acusado de ameaçar os moradores do quilombo. O conflito entre os quilombolas e o fazendeiro, que se diz dono das terras, já dura mais de dois anos.
A terra disputada é caracterizada por muita água, terra boa, fartura de peixes e mariscos. O lugar fica em uma das mais de 20 ilhas do arquipélago de Tinharé.
A Fundação Cultural Palmares reconheceu a área como remanescente de quilombo em 2009. Trinta famílias moram na comunidade de Batateira. A maioria vive da pesca. Os moradores contam que o sossego no local acabou há dois anos, quando começaram as ameaças.
Com medo, uma moradora pede para não ser identificada. Ela explica o que está acontecendo na comunidade. “A morada aqui é boa, mas Maneca tá aperreando demais a gente. Ele botou revólver para meus netos, para meu filho", relata.
Os moradores dizem que Manoel Palma Ché Filho seria o responsável pelas ameaças. Maneca Ché, como é conhecido, tem fazendas na região. No mês passado Maneca teria invadido a comunidade com homens armados. Representantes dos quilombolas prestaram queixa na delegacia de Cairú. Manoel já havia sido denunciado em 2009. Um promotor pediu a prisão preventiva do fazendeiro.
“Nós entendemos que era necessária a prisão para garantir a ordem pública, ou seja, para impedir que Seu Manoel retornasse ao local com um suposto grupo criminoso e voltasse a praticar delitos contra a comunidade, enquanto não se resolve a questão de reconhecimento da comunidade quilombola. A população mencionou que Seu Manoel teria contratado um grupo armado, que teria efetuado disparos de arma de fogo para o alto, derrubado casas, ameaçado os moradores e tentado tomar a área à força”, conta o promotor Jader Alves.
Além de negar todas as acusações, Manoel apresenta um documento de 1941 que, segundo ele, provaria a posse das terras. Ele afirma ainda que os moradores não são remanescentes de quilombos.
“Na Batateira nunca existiu ninguém, nunca houve nada. Há cerca de oito anos as pessoas que pescavam no rio me pediram autorização para montar lonas e casas de palha e eu permiti. Se aquilo ali for uma comunidade quilombola então eu quero o título de ‘senhor Manoel Palma Ché quilombola’", argumenta Manoel Ché Filho.
A Superintendência do Patrimônio da União (SPU) diz que a área não tem dono por ser uma ilha, não sendo sede de município. A Superintendência divulgou nota afirmando que aguarda apenas a conclusão do relatório técnico do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para concluir o processo de regularização da terra da União em favor da comunidade quilombola.
O Incra é responsável pela demarcação de áreas remanescentes de quilombo. O superintendente baiano diz que resolver a situação de Batateiras é prioridade.
“Nós já encaminhamos para Brasília um ofício ao presidente do Incra pedindo que a área fosse inserida como uma das 20 comunidades que vamos trabalhar esse ano a partir de um edital que está sendo elaborado em Brasília, para a contratação dos serviços antropológicos e a partir daí a gente espera que em agosto o edital seja aberto e em setembro, no mais tardar em outubro, a gente inicie os trabalhos com a comunidade”, pontua Luís Gugé, superintendente do Incra na Bahia.
A comunidade sonha com a posse definitiva da terra. “A gente quer botar pra frente mesmo isso aí. A gente quer ficar aqui”, diz um morador da região.
O superintendente do Incra na Bahia disse ainda que informou à delegacia agrária nacional sobre as ameaças sofridas pelos quilombolas para que providências sejam tomadas até que o processo de concessão do título da terra seja concluído.

Fonte: Disponível em: <http://g1.globo.com/bahia/noticia/2011/06/fazendeiro-e-quilombolas-entram-em-conflito-por-terras-no-baixo-sul-da-ba.html>. Acessado em 14 de jun. de 2017.

Criado em 09 Junho 2017
Salvador – Provocada por ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública da União (DPU) em Salvador em 2011, a Justiça Federal em Ilhéus determinou, em decisão de mérito conhecida nesta sexta-feira (9), que a União se abstenha de autorizar ou permitir que terceiros usem a área ocupada pela Comunidade Quilombola Batateira, localizada na Ilha de Tinharé, município de Cairu, há mais de cem anos. O juiz federal Lincoln Pinheiro da Costa também proibiu o fazendeiro M.P.C.F., um dos acusados de agredir os quilombolas, de entrar no terreno, sob pena de multa no valor de R$ 5 mil. O réu também foi condenado a pagar indenização de R$ 20 mil por danos materiais e R$ 50 mil por danos morais causados à população vulnerável.
Por conta da especulação imobiliária, a região é palco de constantes conflitos por posse de terra entre os quilombolas e fazendeiros. Há seis anos, defensores federais visitaram o local e constataram as denúncias de invasão, agressões e ameaças, além da destruição de quatro casas na comunidade. A ação civil pública em favor da comunidade foi então ajuizada.
Na sentença, o magistrado ressaltou que a comunidade já é certificada pela Fundação Cultural Palmares e a área já está em processo de delimitação, demarcação e titulação para os remanescentes de quilombo no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O juiz observou ainda que, embora a União não tenha resistido à pretensão e tenha reconhecido a legitimidade do direito da comunidade sobre as terras, é notória a paralisação do processo de demarcação de terras de comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas, pelo governo federal.
Átila Dias, defensor regional de direitos humanos para os estados da Bahia e Sergipe, comemorou a decisão. Ele explicou que, como a DPU não tem sede em Ilhéus, solicitou intervenção do Ministério Público Federal local, que assumiu o polo ativo e reiterou todos os pedidos feitos pela Defensoria Pública da União.
“Essa decisão garante à comunidade o direito de não ter o território invadido. No processo referente à regularização das terras já havíamos conseguido administrativamente a suspensão da autorização para exploração comercial. A Prefeitura Municipal de Cairu suspendeu o licenciamento ambiental para a construção de um condomínio e de oito tanques para piscicultura dentro do território quilombola”, afirmou.
Ainda com relação à regularização, o defensor esclareceu que o Incra informou à DPU, por meio de ofício datado de setembro de 2016, que o processo encontra-se na fase de elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), mas a conclusão do estudo depende do envio de certidões de oito moradores a serem emitidas pelo Cartório de Imóveis de Valença (BA). Em dezembro, a Defensoria solicitou ao cartório todas as informações faltantes ao processo, mas ainda não obteve resposta.
Fonte: RGD/MGM -  Assessoria de Comunicação Social Defensoria Pública da União
Disponível em: <http://www.dpu.def.br/noticias-bahia/37723-atuacao-da-dpu-garante-a-quilombolas-direito-de-nao-ter-area-invadida-na-ba>. Acessado em 14 de jun. de 2017.




2.3 – Imagem e Fotografias

a)      Expansão do turismo (Porto, R., 2016).

Referência: PORTO, José Renato Sant’Anna. Poder e território no Baixo Sul da Bahia: os discursos e os arranjos políticos de desenvolvimento, UFRRJ. Rio de Janeiro, 2016.











B) Casa derrubada na invasão de grileiro à Comunidade de Batateira Fonte: Site da Comissão pastoral da Pesca – CPP






C) Área ribeirinha na Comunidade de Batateiras

  


                        Fonte: Site Justificando/Carta Capital








   3- Taperoá: quilombolas e pescadores em defesa do território de Graciosa

            Taperóa - Bahia é uma das cidades que possuem uma expressiva fonte econômica baseada nas atividades da pesca, mariscagem e agricultura (com destaque para a produção de Guaraná), o município é predominantemente rural e possui quatro comunidades quilombolas auto reconhecidas de acordo com os dados da Fundação Palmares, dentre estas destacamos a Comunidade de Graciosa. A referida comunidade ocupa lugar estratégico por se situar às margens do Rio Graciosa e na divisa com o município de Valença, maior cidade do território do Baixo Sul, essa condição imprime um risco a soberania territorial dos quilombolas de Graciosa, uma vez que o rio que banha a comunidade é uma rota utilizada para chegar até às ilhas de Cairú.

Fonte: Portal do Brasil. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2017/01/fundacao-palmares-certifica-29-comunidades-quilombolas>. Acessado em 16 de jun. de 2017.


  3.1- Conflitos no território pesqueiro e quilombola de Graciosa
Nota da Comunidade de Graciosa
O ano de 2015 com certeza ficou marcado na história da comunidade de Graciosa. Mas, infelizmente, terminou sem grandes comemorações. Se no mês de abril, os moradores conquistaram uma grande vitória ao fazer uma manifestação para não perder parte de seu território que fazendeiros e empresários tentavam tomar, as notícias ao final de 2015 não foram nada animadoras. Em uma decisão arbitrária e amplamente questionável, o juiz Lincoln Pinheiro Costa, da Subseção Judiciária de Ilhéus, encaminhou o processo que versa sobre o conflito na comunidade em favor dos empresários que vêm pressionando o território quilombola e que planejam ali construir empreendimentos relacionados à expansão do turismo na região.
Os moradores da Graciosa vêm enfrentando nos últimos anos, especialmente a partir de 2007, uma série de conflitos em função do avanço de empreendimentos em seu território. Situado na região do Baixo Sul da Bahia, na divisa entre os municípios de Taperoá e Valença, as margens da rodovia BA-001, o cais de Graciosa é considerado uma área estratégica para os empresários. O projeto em questão consiste na construção de equipamentos de infraestrutura e logística (estacionamento, posto de gasolina e reformas no cais) que possibilitariam um novo ponto de embarque para turistas que tem como destino as ilhas de Tinharé e Boipeba, principais pontos turísticos da região e onde está localizado Morro de São Paulo(1) .
A área em questão é utilizada há mais de um século pela comunidade de Graciosa para pesca e mariscagem, as duas principais atividades desempenhadas pelos moradores. Composta por 154 famílias, em 2008, Graciosa foi certificada pela Fundação Cultural Palmares (FCP) como comunidade quilombola e após a aproximação com o Movimento de Pescadores e Pescadoras (MPP) e com o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), vêm se organizando para resistir e enfrentar o avanço de empreendimentos em seu território.
Embora os conflitos tenham se acirrado mais recentemente, os problemas diante de interesses de empresários no território são mais antigos. Entre os anos de 2003 e 2007, a Aquicultura Grupo Graciosa LTDA, empresa de José Alberto Soares, chegou em Graciosa com um projeto que prometia criar uma cooperativa com os pescadores da comunidade. O fato é que este projeto, que teve como proposta a criação intensiva de tilápias e ostras, em nada beneficiou a comunidade. Pior que isso, o empreendimento causou diversos impactos negativos para os moradores, como, por exemplo, a restrição de acesso dos moradores ao rio, o desmatamento de área de extrativismo, o aterramento de fontes de água, o desequilíbrio ecossistêmico e o desaparecimento de parte considerável da fauna local. Em 2008, o projeto de aquicultura foi embargado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
Mais recentemente, no ano de 2014, frente a forte especulação imobiliária relacionada à expansão do turismo na região, José Alberto fragmentou a área e negociou a “venda” para os empresários Fernando Alves Magalhães e Tarcísio Meirelles. Tarcísio é irmão do deputado estadual Hildécio Meirelles (PMDB – BA), político ligado a projetos de expansão do turismo na região. Hildécio, que já foi prefeito de Cairu (município limítrofe) por três gestões (1993-1996, 2005-2008 e 2009-2012), tem declaradamente o turismo como uma de suas principais plataformas políticas para a região, e vem através de sua atuação política viabilizando ações e iniciativas para o avanço deste segmento no Baixo Sul.
No início de 2015, Hildécio assumiu também a presidência da Comissão de Infraestrutura, Desenvolvimento Econômico e Turismo da Assembleia Legislativa da Bahia. A construção dos empreendimentos em Graciosa se ancora, portanto, nesta forte articulação política e econômica, que tem grande poder de influência na região. Apesar do discurso que promete “desenvolvimento”, o modelo no qual o turismo vem sendo promovido no Baixo Sul acarreta em prejuízos diversos às comunidades. Nos projetos de expansão, via grandes empreendimentos, nada se fala sobre o Turismo de Base Comunitária, uma alternativa que poderia de fato contribuir para um modelo de desenvolvimento mais justo e com resultados positivos para as comunidades tradicionais.
Diante dos inúmeros problemas já vivenciados pela presença desses empresários, os quais podem ser observados em maiores detalhes no registro do caso que está disponível no site do Mapa de Conflitos da FIOCRUZ, a comunidade de Graciosa vem promovendo diversas estratégias de resistência aos empreendimentos. Em 08 de abril de 2015, os moradores fizeram uma grande manifestação em defesa desta importante área de seu território, como uma estratégia para barrar a construção dos novos empreendimentos e para pressionar o Intituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a dar andamento a elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Demarcação (iniciado apenas em agosto de 2015), o que garantiria juridicamente a autonomia da comunidade em seu território.
Paralelamente, a comunidade, em parceria com a Associação dos Advogados dos Trabalhadores Rurais (AATR), vem formalizando diversas denúncias na justiça relacionadas tanto aos crimes ambientais e às inúmeras irregularidades dos empreendimentos em questão, como também no que diz respeito às ameaças e pressões que a comunidade vem enfrentando por parte de pessoas ligadas aos empresários. O principal litigio judicializado se relaciona a um pedido de reintegração de posse movido pela Tinharé Comércio de Combustíveis LTDA, que foi julgado na Justiça Federal, na Subseção Judiciária de Ilhéus, pelo juiz Lincoln Pinheiro da Costa. Cabe ressaltar que Tarcísio Meireles, dono da empresa Tinharé Comércio de Combustíveis LTDA, nunca teve posse da área em questão, o que denota a incongruência do pedido de reintegração.
O fato é que diante desta enorme pressão política e econômica exercida pelos interessados na construção do empreendimento, o juiz expediu decisão em favor dos empresários(2) . Agindo de forma arbitrária e em desconsideração ao posicionamento da comunidade de Graciosa, a decisão judicial se configura como uma ameaça concreta ao moradores e principalmente às práticas tradicionais relacionadas à pesca artesanal. O argumento utilizado pelo juiz para tomar sua decisão é amplamente questionável. Enumeramos a seguir alguns dos pontos que julgamos problemáticos:
(i) Em primeiro lugar, a decisão desconsidera a organização interna da comunidade, atribuindo o posicionamento político assumido pelos moradores (contrário ao empreendimento) a supostas “ONGs e advogados”. Ao mesmo tempo, distorce a atuação importante realizada historicamente pelas organizações de assessoria e pelos movimentos sociais no apoio aos grupos que vivem à margem em nossa sociedade e que sofrem com o avanço do “progresso” e do “desenvolvimento”. A comunidade de Graciosa hoje faz parte do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) e é assessorada pelo Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) e pela Associação de Advogados dos Trabalhadores Rurais (AATR) que vêm acompanhando tanto os trâmites burocráticos para a titulação do território quilombola junto ao INCRA e à SPU, quanto os processos judiciais movidos pelos empresários contra a comunidade. Em hipótese alguma isso quer dizer que essas organizações promovem qualquer tipo de “patrulhamento” na comunidade. Todos os representantes que estão à frente do movimento de resistência são moradores de Graciosa e o posicionamento político assumido parte essencialmente da própria comunidade. Ou seja, ciente de todos os problemas que o empreendimento acarretará para a pesca e a mariscagem, é a comunidade que diz NÃO ao projeto.
(ii) Em segundo lugar, o parecer do juiz denomina como “radicalização” um posicionamento absolutamente legítimo da comunidade, que rejeita integralmente os projetos e empreendimentos em questão. Ora, se todas as alternativas ou acordos implicam na manutenção do empreendimento, fato que é contrário ao interesse da própria comunidade, que postura assumir se não a negação do projeto? Porque motivo deveria a comunidade ser complacente ou aceitar um acordo com relação a algo que comprometerá a vida e o trabalho dos moradores? Quem, no caso, estaria sendo radical se são o senhor Tarcísio, os políticos e empresários envolvidos no caso que não abrem mão da construção do empreendimento no território de Graciosa? Durante a audiência e a inspeção, o juiz realizou esforços para que fosse firmado um acordo entre as partes. De que forma esse acordo poderia ser razoável para a comunidade se a construção do empreendimento não é algo que está em negociação? Porque é a comunidade e seus representantes quem deve assumir o ônus do acordo e não os empresários? O que, para além dos interesses econômicos e políticos, justifica e dá legitimidade à construção deste empreendimento?
(iii) Ao tomar tal decisão em favor dos empresários, o juiz negligencia o fato de que a área em questão é território quilombola, reconhecido e certificado pela Fundação Cultural Palmares e com processo de titulação tramitando no INCRA. Contraria, portanto, o processo administrativo que vem sendo conduzido por duas instituições do Estado e que se ampara legalmente no Artigo 68 da Constituição Federal de 1988. A implementação de um estacionamento, de um posto de gasolina e de demais obras de infraestrutura em um local onde os funcionários do INCRA e da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) já estão em atividade, acarretará na tumultuação do processo administrativo já em curso. Desse forma, o efeito da decisão tomada resulta em prejuízo direto para a delimitação do território quilombola da comunidade de Graciosa.
(iv) Por fim, em sua decisão o juiz Lincoln Pinheiro da Costa negligenciou o impacto extremamente negativo que este empreendimento acarretaria para a subsistência e a reprodução socioeconômica dos moradores de Graciosa. Atualmente, dado o aumento do fluxo de lanchas de turistas no Rio da Graciosa, já é possível verificar um processo de degradação dos manguezais da região. A construção do estacionamento e do posto de gasolina, para além de dificultar o acesso dos moradores ao rio, implicará um aumento exponencial da degradação dos manguezais, principal fonte de renda dos pescadores de Graciosa.
A região do Baixo Sul (ou Costa do Dendê), onde está localizada Graciosa e outras tantas comunidades quilombolas, é hoje um dos principais destinos turísticos do litoral nordestino. Neste verão, muitos viajantes procuraram as praias dessa região, mas certamente poucos tomaram conhecimento dos graves conflitos que assolam a população local e seus territórios. O turismo e o desenvolvimento, no modelo em que são pensados e construídos, parecem querer riscar do mapa as comunidades tradicionais.
Mas a resistência existe! A comunidade de Graciosa resiste e por meio desta carta vem a público dizer NÃO AOS EMPREENDIMENTOS do turismo em seu território.
Associação de Pescadores e Marisqueiras de Graciosa
Associação de Remanescentes Quilombolas de Graciosa
Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais – MPP
Conselho Pastoral da Pesca – CPP
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia – AATR
Grupo de Assessoria Jurídica Popular – Universidade Estadual da Bahia – UNEB
Nota:
(1) No âmbito da expansão do turismo na região do Baixo Sul da Bahia, se a comunidade de Graciosa está localizada no ponto de embarque para as áreas turísticas, a comunidade quilombola de Batateira está situada no local pretendido para o desembarque, já na Ilha de Tinharé. O conflito nessa comunidade é marcado por graves episódios de violência, envolvendo articulação de policiais e políticos locais. Clique aqui para saber mais a respeito.
(2) São três processos diferentes movidos contra a comunidade, sendo um em nome de José Alberto Ornellas, um em nome da empresa Tinharé Comércio de Combustíveis LTDA, e outro em nome de Fernando Alves Magalhães, que também “comprou”, de maneira irregular, parte da área em questão.
Fonte: Site Racismo Ambiental. Disponível em: <http://racismoambiental.net.br/2016/01/28/carta-de-repudio-baixo-sul-da-bahia-sofre-nova-ameaca-a-comunidade-quilombola-de-graciosa/>. Acessado em 20 de jun. de 2017.




3.2  – Imagens e Fotografias
       a) Mobilização na comunidade
Fonte: Site da Comissão Pastoral da Pesca - CPP
b) Campanha

Fonte: Site da campanha pela regularização do território pesqueiro
       



  4 - A luta continua: considerações finais
          
     Os conflitos e enfrentamentos vistos ao longo desse trabalho relatam as contradições do processo de desenvolvimento pensando historicamente para região do Baixo Sul da Bahia, seja no caso de Valença com o pioneirismo fabril no interior da Bahia datado da primeira metade do século IXX, ou no caso das fazendas do hidronegócio aliados à especulação dos empreendimentos turísticos de alto impacto. O que percebemos é a reprodução de projetos impostos de maneira verticalizada, onde a exclusão econômica e social e os impactos ambientais são os ônus que ficam para a população local.
Nesse sentido é muito importante tomarmos em conta o que Calazans (2015, p. 85) nos fala: “temos que travar essa “guerra”, dizer o que se passa nos nossos territórios porque os territórios são territórios narrativos, são territórios falados, narrados, cantados e escritos. Não basta anunciar o impacto dos projetos de desenvolvimento.” Segundo o autor existem lugares onde a exploração ocorre de maneira violenta, mas, ainda sim não acontece o conflito, ou seja, só a partir dos enfrentamentos é que podemos colocar o projeto em disputa, dizer o que queremos para aquele território.
Nos casos postos em tela, podemos perceber que as denúncias às  condições precárias de trabalho, ou até mesmo às violações de direitos, só se concretizaram a partir da organização operária na CVI e da resistência protagonizada pelas comunidades pesqueiras e quilombolas da Costa do Dendê. Pois para denunciar que está sofrendo impactos é necessário anunciar a sociedade que existe um processo de disputa ali e que os empresários e patrões não estão no território para trazer “melhorias” para região, pelo contrário, a prática deles é de exploração da população e dos bens naturais locais.





       5- Referenciais Bibliográficos

CALAZANS, Marcelo. Territórios de utopia. In: Territórios de Utopia:
CVI. ArtigosWeb. Disponível em: <http://www.webartigos.com/artigos/industrializacao-em-valenca/59643/#ixzz4kqkq8lw5>. Acessado em 20 de jun. de 2017.

EPIFANIA, Anderson Gomes da. Território de Identidade Baixo Sul Baiano: Análise Socioeconômica e Perspectivas. Disponível em: <http://eng2012.agb.org.br/lista-de-artigos?download=140:territorio-de-identidade-baixo-sul-baiano&start=180.> Acessado em 18 de junh. de 2017

Estatísticas dos Municípios Baianos. Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Disponível em: <http://www.sei.ba.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=89&Itemid=285>. Acessado em 28 de jun. de 2017.

PAIXÃO, Neli Ramos. Ao soar do apito da fábrica: idas e vindas de operárias(os) têxteis em Valença – Bahia (1950 – 1980). Universidade Federal da Bahia, dissertação, 2006.

Plano Desenvolvimento Territorial Sustentável. Conselho Gestor Territorial - Colegiado Território Baixo Sul Da Bahia Núcleo Executivo Território, 2010. Disponível em: <http://sit.mda.gov.br/download/ptdrs/ptdrs_qua_territorio021.pdf>. Acessado em 25 de jun. de 2017.
PORTO, José Renato Sant’Anna. PODER E TERRITÓRIO NO BAIXO SUL DA BAHIA: Os discursos e os arranjos políticos de desenvolvimento, UFRRJ. Rio de Janeiro,  2016.
Resistências aos impactos dos projetos de desenvolvimento no Brasil. Joana Barros, Anelise Gutterres e Evanildo Barbosa da Silva (Organização) 2015.

VIEIRA, Mário Ronaldo Rodrigues. Memória das mulheres operárias da Companhia Valença Industrial (CVI). Universidade do Estado da Bahia – Campus V, dissertação, 2010.




[1] Texto introdutório produzido a partir do Plano Desenvolvimento Territorial Sustentável. Conselho Gestor Territorial - Colegiado Território Baixo Sul Da Bahia Núcleo Executivo Território, 2010.

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